O Cósmico Segredo das Horas Vagas

31 março, 2005

+ Gostos

Gostava de não pensar tanto.
Gostava de ocupar as horas vagas com pensamentos vagos.
Gostava de ver o geral e não pormenores.
Gostava de conseguir transformar todas as ideias em palavras.
Gostava que cada letra não fosse um parto difícil, e cada pensamento um filho enjeitado.
Gostava de ser mais claro.
Gostava, um dia, abrir os olhos e ver o mar.

30 março, 2005

+ Família menos 1

Morreu o tio Augusto.
Tinha de morrer, mais tarde ou mais cedo.
Parece que já não estava muito “augusto” e a altivez de ontem jazia deitada num caixão barato. A minha tia sempre foi muito poupada. Lembro-me ainda de um Natal em que um pato alimentou mais de vinte bocas! Milagre da multiplicação do pato, não fosse ela muito religiosa. Muito Pai Nosso, Avé Maria, Actos de Contrição, Salve Rainhas e Credos e no meio da minha desculpa para não ir ao funeral, ela diz:
-Ainda bem que foi hoje! É quinta-feira Santa! É uma boa entrada no céu!...
Fiquei sem palavras. Este é um bom dia para morrer. Nunca tinha pensado em tal.
Boa sorte, tio. Não esperes por mim!

29 março, 2005


Arlinda... A mestre da Limpeza

+ Arlinda, o anjo cabo-verdeano ou a Star Parisiense

A minha Arlinda é morena. Morenita. Veio de Santiago, Cabo-Verde, tem dois filhos, o Thierry e a Aracy, e se me deixar corto os pulsos. Esta máquina de limpeza que cá vem todas as semanas tem sido confundida com outra. Quando falo da minha Arlinda há uma certa tendência para considerarem minha a Arlinda que não me pertence. A Arlinda que anda nas bocas do mundo, a que foi do Algarve directamente para Paris, é uma cantora sem créditos dados, possuidora de uma mala de cartão duvidosa e irreverente fotógrafa que tem a "sorte" de ter financiamento para máquinas fabulosas, com objectivas fantásticas . De qúalquer maneira, a minha Arlinda é muito "má linda". É só para deixar bem claro, que a minha mais escura Arlinda merecia maior destaque na televisão. Na Quinta das Celebridades, em que inequivocamente tombo os olhos nos zappings, não haveria burro a brilhar, nem porca com lustro ou camas a cheirar a estreia que bastassem. A minha Arlinda não deixaria impune mácula de nódoa ou mancha suja. A outra bem pode pavonear-se, deambular a área pélvica do corpo e abusar da rouquidão que não tem como ultrapassar a Arlinda. A minha. Não é, gajo?

+ A Costureirinha da Ajuda

Era suposto ser da Sé, mas ando mais por estas bandas e o rótulo assenta-me melhor cartograficamente. Adiante... ando a coser. Nem cebolas ou batatas. Coser, com "s". Pedi à sogra, sabedora da arte, e lá me veio parar a casa uma máquina de costura portátil com pedal e tudo. Foi mais de uma hora descortinar como é que raio se enfiam as linhas e por que buracos e como é que, por obra e graça de uma entidade qualquer, a linha de cima se enrola em nó com a de baixo. Cosi mas ainda hoje não sei como... Mas o meu serão estava longe de ter tanta agitação, mas como TODO o mundo resolveu passar os olhos pelo The Ring 1 na altura em que o The Ring 2 estreia em cinema, fiquei sem filme nocturno para alugar. E insisto em não ver a sequela sem o primeiro... E o povo nem deixou nem um nas prateleiras do Blockbuster para me maravilhar esta noite. Eu, que precisava tanto e me distrair depois deste dia surreal , repleto de tsunmis imaginários e reportagens fora de prazo, fiquei pregada à máquina de costura. Tenho o gajo meio dormir colado aos olhos da Kim Basinger, no AXN, martelo como uma louca neste teclado e olho de soslaio para a cozinha. Boa ideia a de ter organizado, cá em casa, nesta gaiola onde cabem dois, um belo jantar de Páscoa com família e ovos Kinder... Não consigo ver a torneira, existem pratos gordurosos, copos encavalitados e um sem número de talheres espalhados pelo balcão chamando pela Arlinda. Este anjo cabo-verdeano que nos deixa a casa num brinco todas as semanas, terá um treco dos grandes quando avistar a montanha de cerâmica, comida e molho que esperam por detergente. Já nem garfos limpos tenho. Limpei dois na casa de banho, com sabonete líquido, para o jantar de hoje. Não me orgulho desta indiferença pela lida doméstica, mas depois de 12 bocas, 24 pés e mãos e 12 rabos para sentar, só possível virando o sofá ao contrário, mereço este descanso. Arlinda, força rapariga, és a maior!!

24 março, 2005

Digestão

Horas vagas… eu queria que este blog se chamasse Horas Vagas!
Já existia! Mais uma vez imitado por antecipação!Eu juro que não entendo! Pequenos seres devem entrar no meu pensamento e as minhas melhores ideias vão parar a outros! Só pode ser!
Assim nasceu este blog bastard inspirado numa canção que é umEspectáculo.
Com quase 40 anos nunca fiz um Diário. No entanto, a escrita quotidiana de Torga fascina-me e inspira-me. Quando há perto de dois anos, juntamente com uma colega, entrevistámos Bombas inteligentes,Gatos que mal fediam e estudiosos "transmontanos" da blogoesfera, nunca imaginei que hoje estava aqui, a martelar no PC. Letra a letra, só com um dedo, que de outro modo não sei.
Escrever sobre o quê?
O dia de hoje?O dia de ontem?
Da tal janta dos 26 euros? Ou de quem lá estava?...
Até que foi um bom jantar…quase que foi um jantar muito bom e não foi pelas 26 razões.
Gosto de pessoas normais. Gente que ri alto quando tem vontade, que dá um espirro sonoro sem vergonha, que solta um palavrão quando não arranja substituto. Pessoas que não sendo banais, são normais!
Alem da velha, (do andar debaixo), detesto gente com ar estudado e imaculado, gente que bebe whisky e nunca provou vinho, que se acha o máximo sem nunca ter atingido os mínimos. E eu tive o azar de calhar comum ao meu lado durante o repasto. Não sei o que as gajas vêem nestestipos, bonitinhos, lavadinhos e cuidadosamente despenteadinhos.
É verdade, não sou um primor de beleza, eu sei. Mas gosto de estar comos meus amigos, de não me preocupar em fazer sala e a idade já não ajuda a esconder uma certa falta de paciência para gente tão cheia de si.
Estou farto de falar de gente que não gosto, até pago mais 26 euros paranão falar deles.
É o que prometo para a próxima.

+ Promessas, promessas...

"Ele" diz que vai escrever qualquer coisa. Passou a manhã inteira a dizer isso... Vai demorar, decerto, duas horas, de roda do papel e caneta, a ligar para perguntar como se acede a isto. E eu, espertinha cibernauta, em pleno trabalho, entro, escrevo e "babum"! Done! A minha autoestima cresce nestes momentos de "auto-lustração". Às 16 horas, porque o governo deu tolerância de ponto, tenho a missão de compor uma reportagem... sobre a dita tolerância, entenda-se! MAS QUE RAIO VOU EU FAZER? Trânsito? Finanças fechadas? O meu ar de inveja? Que pergunto? Concordam, não concordam? Que reportagem idiota... Um off, não mais! A inconsistência jornalística aflige-me, perturba-me. Ainda bem que tomei o comprimido hoje. Não só para um acréscimo químico de paciência para aturar esta comunidade laboral que me rodeia e constrange, como para receber com sorrisos os miados da Pulga, que hoje foi tirar os pontos. Tem os dois canais "ováricos" atados! Já não suportavamos os esguichos de urina nos cantos da casa, os gritos dilacerantes de quem quer ser "coberta" por qualquer ser que se mexa e que tenha um apêndice sexual! O cio é uma coisa lixada... Por isso, ZÁS! Operação com ela... e hoje, já sem funil na cabeça e sem pontos, vai ser bonito, vai...
Quero muito ir para Amsterdão! Ficar a flutuar no fumo etéreo dos CoffeeShops, sorrir todas as horas e escolher as montras mais coloridas da rua vermelha. Um fim-de-semana destes partimos para lá e levamos na bagagem a Helena, o Zé Luis e a Izzy!! E quem quiser afundar as mágoas nos canais erbários holandeses.

A Estreia

Foram 26 euros de bebidas alcoólicas de alto teor. Nenhum de nós as ingeriu mas pagamo-las. E bem! Por isso, ou talvez não, deixámos sem custo o restaurante comunitário em direcção a casa. Ele entre às oito da manhã na labuta do operário por conta de outrém. E a esta hora, de livro de Miguel Torga na mão em busca de um título "baril", TV na Sic (vá-se lá saber porquê!) e Depeche Mode, baixinho, para não acordar a bruxa da velha que vive aqui por baixo, ei-lo! Bem-vindo sejas, Blog! Ou log... ou bloco. Whatever.Vieste, calmo e sereno, sem cordão umbilical, choros ou costuras nas nossas barrigas. Foi mais fácil do que estavamos à espera. Ele olha. Ela escreve. Para a próxima, escreve Ele. Não escreves?