O Cósmico Segredo das Horas Vagas

24 fevereiro, 2006

Só para dizer...


(se fosse a magnífica letra de Carlos Tê brilhantemente interpretada pelos Clã, seria bom... mas não é...)
... que anda com umas cólicazecas que a fazem choramingar a torto e a direito (já lhe dei o Infacol!) e que a Milia continua nas bochechas. Mas tendo em conta que ataquei o Monstro Crosta com o shampoo da Mustela, a malvada vilã deixou-se escorrer para o rosto! Uma miséria franciscana... besuntei-a em Almaderm nas pálpebras, narizinho e sobrancelhas. Se a puser na frigideira fará tttttssssssssssssss......

22 fevereiro, 2006

Devia ter sido Hoje...


Devias ter nascido amanhã. Dia 23 de Fevereiro.
No dia 18 de Junho, a manhã confirmou a tua vinda. Um teste, na casa de banho, e o coração nas mãos. Sem saber se deveria rir ou chorar. Com toda a minha vida centrada em duas riscas cor-de-rosa. O teu pai, na sala, respeitando a minha intimidade. Sentada no tampo da sanita atenta aos minutos que passavam e a ver nascer uma confirmação forte e bem marcada no mostrador do teste. Saí com ele na mão. «Vês? Eu sabia que estava grávida.». O teu pai a destilar alegria. Eu sem saber o que dizer. De sorriso idiota no rosto... o primeiro dia do resto, de tudo o resto.
O teu pai perguntou se eu estava contente. Não soube responder com determinação. Foste planeada. Muito desejada. E agora?
Marquei com a S. consulta para esse dia. Carreguei um tripé nessa tarde de trabalho e mal podia em mim de satisfação. Um crescendo de contentamento que ao longo do dia me foi enchendo, rebentando-me as costuras.
Entrei no consultório com a S. a rir. Muito. Só me recordo com clareza da frase «Ai, não acredito... com 5 semanas e já se ouve o coração. Olha só...» E um ponto, um dot, uma mancha no écran a pulsar. Só se ouvia... Bum, bum, bum, bum, bum... com o ritmo assustador, cheio de vontade. Devias nascer no dia 23 de Fevereiro. Ali ficou determinado, no monitor do ecógrafo. Dia 23 de Fevereiro. Data provável do parto. Era uma da manhã. Ligámos a mundo... mesmo assim, telefonámos ao mundo.
Porque a S. permitiu, embarquei no dia seguinte para Cabo Verde. Um fim-de-semana, rápido, de trabalho... sem esforço físico. Fui e por lá notei um corrimento... escuro. Voltei e continuou... escuro. Terça-feira seguinte deixei o provador da Lanidor, as roupas por comprar espalhadas no chão e um medo corrosivo na garganta.
Devias nascer a 23 de Fevereiro.
Entrei na Estefânia. Urgências de Maternidade. O Hospital mais próximo... numa sala repleta de médicos e enfermeiros... sentados, lá foram dizendo... «Sabe que este não é o seu Hospital de residência não sabe?»... estava com perdas de sangue... estava com perdas de sangue, por favor... A médica, com cara de poucos amigos, deixou um chorrilho de frases ignóbeis na minha memória: «Conte lá...», «Dispa-se e deite-se na marquesa»... «Colo fechado mas com corrimento de sangue, sim. Pois é uma ameaça de aborto.»... «Ai a sua médica foi a Londres a uma conferência sobre ecos a 3D? Ai, para isso também se vai a conferências?»... «Agora? Então, agora, quando ela vier lá de Londres... vá a uma consulta com ela!!»... «Descanso é tudo o que lhe receito. Nesta altura do campeonato não pode tomar nada.»
- Há alguma coisa que eu possa fazer além do descanso?
Uma enfermeira, que continuou sentada desde a minha chegada, soube quebrar-me em estilhaços. «Então, agora é a natureza que decide»
Devias ter nascido a 23 de Fevereiro.
Fui para casa com uma cascata de lágrimas trancada no peito. Deitei-me no sofá. Ali fiquei, com poucas palavras, que qualquer uma arrancava facilmente um soluço. Mandei umas mensagens e durante dias não atendi telefonemas. Quando a S. voltou confirmou-se o descolamento de placenta.
Parou a hemorragia. Prescrição? Sossego, descanso, magnésio e óvulos de progesterona. Ficámos em casa 3 meses. Enfiadas no sofá, na cama, na angústia. Na angústia da próxima consulta... semanal... depois quinzenal. Pilhas de ecografias. Um pai extremoso... um marido inigualável. Litros de água à minha beira, bolachas, mimos, telemóvel, lençól fresco, comando da TV, telemóvel e almoço feito no microondas. Partia e deixava-me só. Partia ele com o peitinho apertado. O telefone tocava a toda a hora. Chegavam as mensagens. Pedia que me visitassem.
Devias nascer a 23 de Fevereiro.
Em Agosto o papel higiénico chegou ensopado num coágulo. Convenci-me do pior no caminho que fiz até à sala. Avisei o teu pai... fomos à S. que nos quis ver antes de me enviar para um hospital. E hospital era sinónimo de raspagem... curetagem... aspiração... A S. ouviu o Bum, bum, bum, bum. Outro descolamento e tu alheia. Crescendo. Forte. Grande.
Uma placenta baixa. Dores. Urgência CUF Descobertas. Contracções. Descanso... descanso e uma ansiedade crescente. Valdispert. Nausef tinha um efeito mais soporífero... Adormecia-me.
Bum, bum, bum, bum, bum.
Devias nascer a 23 de Fevereiro.
Deste a volta em Outubro. Doeu. Senti-te em toda a "pujança ginastical". Aturaram-me a ciclotimia. O receio das trissomias e das manias. Das doenças e demências.
Dois CTG's em Santa Maria e a perda da dignidade, da vergonha do meu corpo a estranhos e alheios. Toques e análises, exsudados e depilações.
Devias ter nascido dia 23 de Fevereiro.
A 27 de Janeiro, o líquido amniótico escasseava... a piscina ficava pequena... seca. Amanhã. A S. avisa. Tem de ser amanhã. Decide. Amanhã no Barreiro ou Domingo na Cruz Vermelha. Amanhã... vai ser amanhã.
Mas devias nascer a 23 de Fevereiro.
Nasceste a 28 de Janeiro.
Devias nascer amanhã e tens quase um mês.
Vieste mais cedo...
A bacana que me arranhava a barriga devia ter nascido a 23 de Fevereiro. Veio mais cedo para nos adoçar a vida.
Amanhã acho que vou chorar.


Cortámos-lhe o cabelo!!
Tinha uma patilha de meter medo ao mais hábil camionista luso e um cabelão comprido, a roçar as orelhas, de impor respeito ao maior cromo das berças!
Cortámos. Reunimos os exemplares capilares numa bela caixinha que tem impresso na tampa "My First Curl". É parecido...
Numa bela caixa de papelão, rosa e branca, irei colocar esses cabelinhos, o cordão umbilical, o teste de gravidez positivo e as dezenas de ecografias. Será um relicário, só dela. Um despojo do que vai ficando pelo caminho da sua ainda curta vida. Quero guardá-la com preciosidade e oferecer-lhe quando souber apreciar a riqueza das memórias.
Aqui, esta mãe, dizia algo que me tocou profundamente: a minha filha só vai conhecer a dimensão do meu amor por ela quando for mãe.

19 fevereiro, 2006

Quem canta...


Eu e Ele temos espasmos de alegria quando tudo o que seja assunto escatológico chega à fralda.
Batemos palminhas quando faz cocó... gritamos de alegria quando ouvimos uns flatos... damos pulos de regozijo no momento do arroto sonoro. E porquê? Não há obstipação... não há cólicas, não haverá soluços e não vai bolsar. Passaremos uns meses com este comportamento para, mais tarde, a punir caso faça qualquer um deles publicamente e com semelhante alegria. Mas essa incongruência comportamental (a nossa!) vai ter de ser explicada à bacana. Vai baralhá-la um pouco, decerto...
De qualquer modo, como somos uns pais muito musicais, damos por nós a cantarolar verdadeiros assassinatos durante algumas operações:

- «Enquanto houver leite para dar, a gente vai continuar... enquanto houver leite para dar...»

- «Vamos arrotar... e ficar a ouvir... a rádio no ar... a chuva a cair..»

Não são versões alternativas absolutamente maravilhosas?

Entrou na pré-adolescência...


Ainda pondero contar a minha gravidez "assolapada"... os três meses de baixa... os descolamentos e hemorragias. Reflicto, também, sobre a odisseia do parto... Tenho um GRANDE impedimento: a descrição de ambos seria looonnnggaaaaaaa.
Como tal, vou ficar-me por um post curtinho: a bacana que me arranhava a barriga e que agora me adoça a vida está com Milia. Isto é, borbulhinhas brancas na testa, sobrancelhas e ante-lábio superior. Isto nem seria dramático se não fosse ontem, a enfermeira que me preparou para o parto, avistar, onde ninguém avistava nada, um início de crosta láctea. «Não é nada!! A minha filha não tem disso!» Bem dito, bem feito... hoje lá estavam: pequeninas e amarelhinhas (por enquanto, 3) no couro cabeludo e nos cantinhos das narinhas. Como ontem, por "via das dúvidas", atacámos com Almaderm, hoje a procedimento repetiu-se. Resultado? A rapariga parece um Donut ou uma alheira - OLEADA!
Nem pegamos na máquina fotográfica para eternizar o momento e as visitas são avisadas de que «é temporário»... «muitos bebés têm, sabem?»... «não, não tem a ver com a higiene... é NORMAL!»
Hoje vamos já utilizar o shampô da Mustela para Crostas Lácteas e rezar. MUITO.

16 fevereiro, 2006

+Sôdade...


Ele talvez tenha razão... este Blog talvez se tenha tornado num Blog de grávida e, agora, de uma mãe. Talvez Ele tenha razão... E, entrando na temática da gravidez, dei por mim hoje a vestir uma camisa de botões. Uma camisa que não me servia na gravidez. Chegava ao peito e os botões não apertavam... tinha uma barriga e lá dentro a bacana que a arranhava.
Olhei-me ao espelho.
Senti tanto a falta dela cá dentro... sempre a quis ter cá fora, rápido, rápido... e esta tarde senti-lhe a falta dos pontapés, dos soluços (hoje são um pesadelo e sinónimo de que vem aí leitinho em forma de regorgitação...), do rabinho espetado no lado direito da barriga. Que ali estava mais protegida, a crescer forte e saudável. Olho para ela, a dormir na alcofa, e enternece-me pensar que saiu de mim, que se desenvolveu cá dentro.
Há uns dias estive a arrumar tudo o que dizia respeito à gravidez. Fi-lo com os olhos marejados de lágrimas e com Ele sentado no sofá, sem se aperceber do pranto. Arrumei as ecografias, as mais de 10 ecografias dos descolamentos, do percentil 75, as ecos do pouco líquido e das contracções. Arrumei o livro verde da grávida e os pedidos de baixa por gravidez de alto risco que a obstetra pedia à médica de família. Mirei, por uma última vez, as ecos em que a bacana que me adoça agora a vida não tinha mais do que alguns milímetros... é tão difícil de acreditar. Guardei as análises ao sangue e à urina... e fechei a gaveta. Custou tanto. Enxuguei os olhos atrás do sofá e sentei-me sorridente.
Sinto a sua falta, essa partilha a duas no maravilhoso e extrordinário milagre que é a concepção de uma vida. Tenho saudades também de a saber bem, calma e serena no conforto da minha barriga. Mas, hoje, gosto de sentir o seu hálito quente com cheiro a leite. Respiro-o sempre que posso... um dióxido de carbono com sabor a vida.

15 fevereiro, 2006

+The Challenge

Poderia descrever o meu parto (fantástico, por sinal... sem contar com a recuperação de uma cesariana nos dois dias seguintes!) ou tecer as minhas mágoas pelo facto da bacana, que me arranhava a barriga e que agora me adoça a vida, ser uma comilona de primeira e, após 40m de mama, beber 60ml de suplemento... Não. Vou poupar-vos. A todos!
A Baguinho de Arroz, que continua à espera do rebento (tendo em conta que estaríamos com o mesmo tempo de gestação se a minha Pikena não tivesse de ter saído 4 semanas mais cedo!!) decidiu desafiar-me... Vamos a isso!

4 empregos que já tive:
- Locutora de rádio
- Chefe de Redacção de Imprensa Escrita
- Editora de Música em Imprensa Escrita
- Jornalista

4 filmes que posso ver vezes sem conta (Tenho de colocar maisssss):
- Dirty Dancing
- Monte dos Vendavais
- Paciente Inglês
- Casamento Debaixo de Chuva
- O Amante
- Ligações Perigosas

4 livros que posso ler vezes sem conta:
- A Máscara, de Yukio Mishima
- Novos Contos da Montanha, de Miguel Torga
- Poesia Completa, de Nuno Júdice
- Jerónimo e Eulália, de Graça Pina de Morais

4 sítios onde vivi:
- Seixal
- Madragoa
- Ajuda (mais nenhum...)

4 séries televisivas que não perco (por defeito profissional, são MUIIITTTASSSSS):
- CSI
- Sherlock Holmes
- Poirot
- Lost
- Sex and the City
- Changing Rooms
- BritCom
- Extreme Makeover

4 sítios onde estive de férias (não posso colocar mais??):
- Egipto
- Inglaterra
- Turquia
- Cabo verde

4 dos meus pratos preferidos:
- Chili (not spicy)
- Empadão de Carne
- Pizza
- Carne de Porco à Alentejana

4 websites que visito diariamente:
- asdivasexplicam.blogspot.com
- Uma catrefada deles de mamãs e futuras mamãs
- morganheira.blogspot.com
- www.pinkblue.com

4 sítios onde gostaria de estar agora:
- Brasil
- Londres
- Nova Iorque
- Polinésia Francesa
(P.S.: Sempre com a minha filha... e o tipo com quem casei!!)

4 bloggers que desafio a fazer este inquérito:
- L. (blimunda)
- X. (santiagando)
- L. (lisboaqueamanhece)
- C. (reflexoesdemae)

10 fevereiro, 2006

+ Eu contigo...


Nasceste com a fronteira da pele e das unhas por definir. Com um corte perfeito entre as pálpebras de onde saem os teus olhos ainda um pouco amarelitos da icterícia.
Numa semana não recuperaste o peso com que nasceste e saí do consultório com um nó na garganta só desatado à lágrima no abraço do teu pai.
Ainda choro quase todos os dias.
Com razão, sem razão.
Gastámos 138 euros num sensor de respiração e movimento e, mesmo assim, acordamos a toda a hora para te soprar no rosto e ver o teu nariz franzir. Mesmo assim, trazemos-te para a sala numa alcofa e estamos sempre de olho espetado ao teu peito arfante.
Corta-me o coração ver-te chorar... com fome, com dores, com sono, com medo... dói por dentro a tua aflição quando tomas banho ou mudas a fralda às 4 da manhã.
Andamos tão cansados... o teu pai com exames e sem dormir. Eu, com o mestrado a meio.
Aprendemos a dormir, um pouco, a meio da tarde ou durante a manhã. Apetece tanto colocar-te entre nós, na cama, mas não se deve... por isso, entretemo-nos a encher-te de beijos a toda a hora.
És tão bonita...
Fica connosco para sempre...

Eu contigo, eu consigo fazer o que digo
Eu contigo, eu consigo fazer o que digo
Eu contigo, eu não pago
Eu não devo e eu não temo
Devo dizer-te ao ouvido
Eu sem ti não tem sentido
Tem sido
Devo dizer-te ao ouvido
Bem bom
Bem bom, bem bom
Bem mais do que o que é bom
Bem bom, bem bom

02 fevereiro, 2006

+ Vieste devagar... e plantaste-te no meu coração

Há uns dias, o meu amigo P.B. confessava-se um fiel leitor deste Blog. Dizia que se ria, que comparava as emoções de quem passou pela experiência de uma gestação complicada, como a minha, pelas expectativas de quem estava a um passo de ser "pai" ou "mãe". Nesta amena conversa telefónica, P.B. incidia, com interesse, num aspecto que eu havia referido no Blog: a necessidade de ter a bacana que me arranha a barriga cá fora o mais rapidamente... para protegê-la, senti-la mais próxima e ao meu alcance. Que dentro de mim, tudo era imprevisível... tudo era uma angústia de quem não domina a mecânica do seu corpo. P.B. acrescentava, com a diplomacia de quem foi "pai", que não seria bem assim... que a sensação de impotência é mais forte quando os temos pertinho, frágeis e dependentes de nós. Na altura, não entendi.
A Mariana chegou mais cedo porque não tinha muito piscina lá dentro. O líquido amniótico escasseava.
A Mariana chegou com 36 semanas e 2 dias. Mais cedo. Nunca cedo demais.
A Mariana chegou com um cabelo espesso e quase 3 kilos. Uma prematura, aos olhos da medicina. Uma prematura madura, dizia a pediatra... que o sofrimento no útero faz-nos crescer depressa. Como ela. Mariana cresceu depressa... veio devagar, muitas vezes, perdida no caminho de uma gravidez inicialmente frágil. A sobrevivente Mariana cresceu, por isso, depressa... porque cedo havia de chegar. Pensei que choraria quando a visse mas só tive lugar para sorrisos tontos. Chorei ontem.
Primeiro, sozinha, sentada na beira da cama, enquanto ELE e ELA dormiam... pelas poucas horas de sono, pelo pouco tempo de mama, pela incerteza de voltar a ter uma barriga decente, pelo choro daquele ser, tão pequeno... Depois, com ela deitada nos meus braços, sem querer mamar grande coisa. Pensava que um problema em ter filhos é que, subitamente, somos acometidos por um um medo terrível de os perder. Sentada no sofá, de nó na garganta, com as lágrimas a escorrer em queda livre e a cairem-lhe no rosto. E se... e se... e se um dia saíres da minha vida, eu deixo de viver. Porque se, um dia, te acontecer algo, acontece-me o pior de tudo. O medo de te perder é quase tão grande como o amor que sinto por ti.
Acabei por dar razão ao amigo P.B..
Tudo muda.
Tudo é melhor.
Mas o medo... é um pesadelo amargo que nos habituamos a guardar numa parte incerta do coração e que com ele nos deitamos todos os dias, como a todas as horas da noite abro os olhos para te ver respirar. Tudo vale a pena.
A Mariana chegou, devagar, e «se instalou feito um poceiro dentro do meu coração»*.

*Terezinha, de Chico Buarque