O Cósmico Segredo das Horas Vagas

19 julho, 2005

+ Arlinda, o anjo cabo-verdiano peca com Racismo

A Arlinda é, sem dúvida, a minha companhia mais animada e criativa nestes dias de clausura. Depois de revelar, pujantemente, a sua dedicação e apreço pelos velhos mal-criados, exemplar o qual vive debaixo do meu andar e lhe inferniza a vida, na passada semana deixou bem claro que há ali uma ponta de racismo no chocolate cabo-verdiano.
Falávamos com estranheza da ausência de óbitos chineses nos jornais ou cemitérios. Que fazem eles aos mortos? Ou os comem, ou os dão a comer ou os mandam para a China. No idea… E trocámos umas ideias sobre como vêm para cá, não se misturam…. vendem todos os mesmos produtos e concluímos, analiticamente, que não se trata nada mais do que uma farsa da máfia chinesa. Pontilhei com a notícia de que vivem todos no mesmo apartamento, aos magotes, enfiados aos milhares nos quartos. Arlinda replicou:
«Comós badios! Aqueles pretos, muito pretos… os badios é que gostam de viver assim. Famílias e famílias na mesma casa, tudo ao molho.”
Os badios, no crioulo, são os negros mais negros, sem mácula ariana no sangue. De Angola, Moçambique e Senegal. Esses, os escarumbas, são os badios!
Hoje confirmou-se a minha suspeita! Arlinda sai disparada da casa de banho, com a revista National Geographic na mão, atónita, olhando para uma figura representativa dos primeiros símios que degeneraram em Homens! Claro de que se tratava de um modelo, maquilhado, para o efeito. Mas ela, na sua inocência, lá foi dizendo…
«Isto é mesmo uma pessoa? Há alguém assim?»
Expliquei o que era…
«Mas eu ontem vi uma mulher assim. Tal e qual. Feiiiaaaa…. No Intendente, lá numa loja de roupa, entrei e estava lá uma mulher, que falava inglês. Devia ser lá daqueles países de África. Bem, a mulher tinha o nariz como este, largo e grande, muito preta, muito preta e tão feia. Fiquei logo mais confortada, bolas. Aquela era muito mais feia do que eu. E tinha umas cicatrizes no rosto, umas marcas assim na cara. Era uma coisa… ela até notou, porque eu fiquei a olhar. Estava chocada com aquela cara feia.»
E depois de ter referido a sua desaprovação por pessoas pretas e feias, o que lhe dá uma graça incomensurável, revelou um pouco mais da vida emocional.
Contava que o filho, de 5 anos e esperto como meio mundo, se dava às artes da imaginação. Iam no comboio e ele encabeçou conversa com uma rapariga da sua idade, que lhe deve ter agradado aos olhos. E a meio da conversa, Arlinda ouviu o filho, de 5 anos, contar, qual caçador, à presa.
«Eu tenho uma casa grande com piscina. E é uma piscina enorme. Muito grande. E também tenho cavalos Tenho 3 cavalos numa quinta.»
Abismada com aquele exercício de criatividade, Arlinda acabou por denunciar a sedução infantil.
«Tu saíste-me ainda mais mentiroso que o teu pai!»

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Tenho saudades tuas e adorei este texto.:)
perdi o número do teu telefone mas podemos falar por aqui. Espero que esteja tudo bem contigo.Pelo texto estás a passar uma clausura fabulosa.Espero não me enganar.
Gosto muito de ti.

5:40 da tarde

 
Blogger Repolha said...

Lolllll
O que eu já me ri sozinha com esta história... Mas de facto as pessoas mais racistas que conheci até hoje foram duas miúdas cabo-verdianas no meu 11º ano... passavam a vida a deitar a baixo um tipo guineense. (nota que eram todos portugueses, as ascendências é que eram diferentes...)
E ter uma Arlinda na minha vida também era bom, mas nem para ter mulher a dias eu sou suficientemente organizada Lolll
Dica: leva um iogurte líquido para o quarto e bebe-o antes de dares mama - é um alívio à fomeca... e o leitinho até vai sair mais doce (coisas de avós... hehehe)

12:38 da tarde

 

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