O Cósmico Segredo das Horas Vagas

03 maio, 2005

Que nem tordos

Que nem tordos!

Não há um mês que não morra um! Outro tio que “bateu as botas” e após os tios vêm os primos, aquela massa familiar em que me incluo. Não que isso me preocupe muito, mas começo a olhar de lado para a tipa da gadanha.
Obrigação familiar levou-me a mim e ao meu irmão até um lugar perdido no centro de Portugal. Pelo caminho nem uma palavra sobre a morte, ou mesmo sobre o tio. Falou-se da vida, das nossas vidas. Nem uma palavra sobre o passado, só o presente e o futuro contam. Telefonemas da mãe, irmã do finado, choviam à medida que nos aproximávamos. Chegámos mesmo em cima da hora. O alívio da senhora era visível. Os filhos dela tinham chegado! Terra intriguista e de gente intrometida, sempre a querer saber o que se passa na casa do vizinho. Mesmo com todos os defeitos inerentes aquela gente, gosto daquele sitio e de algumas pessoas, umas quantas já morreram. Recordo os olhos azuis do Martinho e os verdes da Constância, avô e avó, os dias passados na ribeira e na horta em que se aprendia tanto com quem não sabia ler, da senhora Senhorinha, sempre com um sorriso e um doce na mão e o Valter que sendo o mais novo, foi o primeiro a ir.
Enquanto despejavam terra por cima do tio acabado de finar, eu procurava incessantemente estas pessoas. Começou aqui a minha hierarquização dos mortos, afinal o passado também conta.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

sei muito bem o que é isso do "lugar perdido no centro de Portugal"... parece uma ficção até que uma notícia como esta nos desperta e nos faz percorrer um pouco mais de 200 km em silêncio dentro de um carro para ir enterrar um morto. acho esse silêncio normal, tal como acho a galinhagem das mulheres junto ao morto. aconteceu-me há dois anos passar uma noite com a minha mãe, a minha avó, as minhas tias e primas e as minhas tias avós e parentes a velar um morto muito querido por todos e muitíssimo por mim. chegaram a um ponto em que eu nem queria acreditar: elas falavam que se desunhavam, mandavam perfume para o ar porque o morto começava a cheirar mal e riam-se de histórias passadas. inacreditável. depois houve o choro, é claro.
em famílias numerosas temos de passar por isto muitas vezes....
blimunda

12:45 da tarde

 

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